Falta de fiscalização e conhecimento impede funcionamento de leis importantes no país, como a lei da 'fila no banco', lei do 'SAC', de atendimento preferencial e a que proíbe a venda casada. Para especialista, o consumidor até tenta reclamar, mas na maioria das vezes, não consegue ser atendido
Quinze minutos para ser atendido no banco e um para cancelar o contrato com a operadora de telefone. Não ter que ligar para reclamar daquele seguro de perda e roubo do cartão de crédito que você nunca pediu e completar 65 anos com a tranquilidade de ser atendido preferencialmente no caixa do supermercado. O cenário parece impossível, mas cada uma das situações acima é amparada por uma lei específica no país. O que não acontece por aqui é o cumprimento da legislação. Vezes porque não há fiscalização e outras por desconhecimento do brasileiro, que sem saber dos seus direitos, não exerce a devida cobrança e, quando lesado, não sabe a quem recorrer.
“Uma lei não impera por uma série de fatores, mas o principal problema que ocorre no país é a falta de fiscalização do poder público”, explica o advogado e especialista em direitos do consumidor, Bruno Burgarelli. Ele diz que, na maioria das situações, a pessoa até tenta acionar o órgão responsável, mas não consegue ser atendida. “Ela chama o Procon, mas não tem fiscal. Aciona a Polícia Militar que não comparece porque não é competência deles. Isso tudo vai inibindo a aplicação dessas leis no dia a dia”, conclui.
Até junho de 2014, o Procon de Minas Gerais havia registrado 116.382 reclamações. A telefonia celular foi o assunto mais demandado, seguido da telefonia fixa, de problemas com bancos e cartão de crédito. Entre as principais reclamações feitas pelos consumidores, a cobrança indevida ou abusiva ficou em primeiro lugar. Serviços de garantia, como falta de abrangência ou cobertura, também estão no ápice do ranking, com mais de 8 mil queixas registradas, o equivalente a 12,12% do total. Entre as empresas mais reclamadas estão a Oi, a Claro, a Vivo, o Itaú, a Tim e o Bradesco.
A técnica de controle e medição, Laiza Silveira, pagou valores acima do acordado com uma operadora de telefonia e ainda paga por um serviço que cancelou em novembro. “Solicitei o cancelamento do Oi Velox no dia 10 de novembro. Minhas contas são em débito automático e vencem todo dia 20. Recebi um e-mail confirmando o cancelamento, dizendo que a Oi entraria em contato, mas, como sempre, ela não entrou”, explica. No dia 10 de dezembro, um mês depois de realizar a operação, a fatura chegou na casa de Laiza. “Deste então, tento enlouquecidamente um contato com a Oi, mas eles não me respondem”, reclama.
De acordo com decreto 6.523, aprovado em julho de 2008, que regulamentou a lei 8.078/90 e fixa normas gerais sobre o Serviço de Atendimento ao Consumidor por telefone, o pedido de cancelamento de Laiza teria que ter sido concluído no prazo máximo de cinco dias úteis, a contar do registro. A lei também diz que o acesso inicial ao atendente não pode ser condicionado ao prévio fornecimento de dados pelo consumidor e que é vedado solicitar a repetição da demanda após o primeiro registro, fatos que não ocorreram no atendimento de Laiza.
“O atendimento é sempre confuso. Eles, antes, verificam dados pessoais umas três vezes, aí passam informações desencontradas e diferentes. Cada vez que se faz contato, dizem uma coisa”, conta o microempreendedor James Márcio Rizo, também insatisfeito com uma empresa de telefonia. Ele diz que enfrenta problemas diariamente e que ultimamente, tem recebido ligações de cobrança antes da data de vencimento do boleto. “A lei do SAC, no caso da telefonia, está longe de ser cumprida. Assim, sempre recorro à Anatel”, finaliza.
Para o advogado Bruno Burgarelli, antes de recorrer ao órgão fiscalizador, a pessoa que se sentir lesada, deve, primeiramente, tentar contato com o primeiro responsável. “Tem que tentar conversar com a pessoa responsável pelo fato, o gerente, por exemplo. Isso não resolvendo, é preciso documentar o acontecido no intuito de obter provas de que aquela situação realmente ocorreu. Depois disso, se nada for resolvido, aí sim, é preciso buscar o órgão competente”, explica.
Veja quais são seus direitos no caso de cinco leis que existem, mas não são devidamente fiscalizadas:
Lei Estadual 14.235/2002 ou Lei da “Fila de banco” - Sancionada em abril de 2002, ela determina que o cliente pode esperar por atendimento, no máximo, 15 minutos. O tempo é contado desde a entrada do cliente na fila até o início do efetivo atendimento. A mesma lei determina que o estabelecimento bancário forneça ao cliente senha de atendimento, na qual deve constar número de ordem de chegada, data e hora de entrada no estabelecimento. Acrescenta, ainda, que o estabelecimento é obrigado a instalar banheiro e bebedouro para os clientes.
Lei Federal 10.048, ou de Atendimento Preferencial - A reserva obrigatória de assentos especiais para idosos, gestantes, lactantes, pessoas portadoras de deficiência e pessoas acompanhadas por crianças de colo nos transportes coletivos existe. A medida opera em acordo com a Lei federal 10.048, de novembro de 2000, mas não é respeitada. Passageiros comuns ainda se acumulam nos bancos e, na maioria dos casos, nem o motorista, nem o cobrador fazem alguma coisa para mudar isso. Não existe, no texto da lei, artigo ou parágrafo que obrigue as empresas a fiscalizarem os assentos. Assim, fica por conta do bom senso das pessoas, que parece não existir.
Criança de colo x criança no colo - A lei não traz qualquer definição sobre o que seja criança de colo. Cabe, portanto, mais uma vez, o uso do bom senso para identificar se a criança precisa de seu responsável para poder locomover-se ou se está apenas '‘descansando’' no colo.
Lei 8.078, decreto 6.523, ou Lei do SAC - De acordo com o decreto, aprovado em julho de 2008, o Serviço de Atendimento ao Consumidor (SAC) por telefone deve funcionar 24 horas e deve ser gratuito. O texto também fixa outras normas, como a determinação de que a transferência para o atendente que vai resolver o problema não pode demorar mais de um minuto e que o acesso inicial não deve ser condicionado ao prévio fornecimento de dados pelo consumidor. A determinação vale apenas para empresas que prestam serviço regulamentado pelo governo, como operadoras de telefonia, bancos, planos de saúde, cartões de crédito, seguradoras, concessionárias de energia e água e transporte.
Venda casada - A venda casada é proibida pelo Código de Defesa do Consumidor, constituindo crime contra as relações de consumo, segundo artigo 5º, da Lei 8.137/1990. A prática de venda casada configura-se sempre que alguém condicionar, subordinar ou sujeitar a venda de um bem ou utilização de um serviço à aquisição de outro bem ou ao uso de determinado serviço. É quando aparece na fatura do cartão de crédito um item “Seguro Perda e Roubo”, por exemplo e você não pediu por ele. Em casamentos ou formaturas, muitas vezes, ao fechar negócio com o salão de festas X, a decoração ou a filmagem só pode ser feita pela empresa Y. Isso também é crime.
Fonte: Postado em 21/01/2015 07:00 / atualizado em 20/01/2015 19:18 - EM - Economia - Alessandra Alves.
A deputada Liza Prado é efetiva da Comissão de Defesa dos Direitos do
Consumidor da Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais.
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