Dia do Consumidor: após 25 anos do Código de Defesa, o que
devemos celebrar?
Por Ana Lis Soares -iG São Paulo
Fim da publicidade para crianças e identificação de
alimentos transgênicos - o que foi alcançado e o que ainda é frágil na lei
O Código diz que consumidor é vulnerável por vários motivos,
tais como condição econômica e falta de acesso à informação
‘Consumidor é toda
pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final’, diz a Lei dos Direitos do Consumidor, de 1990. Nesta
terça-feira, 15 de março, é comemorado o Dia Mundial do Direito do Consumidor;
no Brasil, também celebramos os 25 anos da vigência do Código de Defesa do
Consumidor – considerado como um dos mais avançados do mundo, já que estabelece
regras para a relação entre fornecedores e compradores e, principalmente, por
ser consequência da pressão popular.
“O Código de Defesa do Consumidor é uma lei inovadora que
foi pensada há 25 anos, mas ainda abrange nossas necessidades hoje”, defende a
coordenadora executiva do Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec),
Elici Bueno.
Durante as duas décadas, alguns avanços foram realizados, um
dos mais recentes, apontado pela especialista, é a condenação pela 2ª turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), no último dia 10, do uso de publicidade e
venda casada dirigida ao público infantil a partir de um caso envolvendo a
Bauducco.
Segundo a advogada do Instituto Alana, Ekaterine
Karageorgiadis, a decisão do Superior Tribunal de Justiça, que acontece poucos
dias antes do Dia do Consumidor, consolida a prioridade absoluta da criança,
direito garantido no código de defesa do consumidor, no ECA (também publicado
em 1990) e na Constituição de 1988.
“No mercado de
consumo, faz 25 anos que temos esse ordenamento jurídico, porém as empresas
insistem em desobedecer a lei porque a publicidade favorece a venda, além de
terem a certeza de impunidade. Este caso traz repercussão, dá recado às
empresas para não descumprirem as regras, aos órgãos que atuem com mais
efetividade, e que as pessoas (consumidores) tomem consciência de seus direitos
e não aceitem abusos”, defende a advogada.
Para Ekaterine, a sociedade deve denunciar sempre que houver
desrespeito, uma vez que a lei deve cumprida. “Neste Dia Mundial pelo Direito
dos Consumidores, temos de comemorar porque, finalmente, o Judiciário olha de
forma direto para a questão, então nossa expectativa é de que o direito deverá
ser cumprido com mais cuidado e inspire ao não abuso pelas empresas”, finaliza.
E não só os consumidores mirins que têm direito ao cuidado.
O Código diz que o consumidor possa ser vulnerável por vários motivos, tais
como condição econômica e falta de acesso à informação. Por causa disso, Elini
Bueno defende que agências reguladoras sejam mais cuidadosas – e critica o modo
com que vêm trabalhando até agora, um dos pontos mais importantes para a
mudança, de acordo com ela. “Tantos abusos da publicidade, por exemplo, mostram
que o Conar deixa coisas passarem há anos. Falta um rigor”, diz.
Outros avanços são apontados pela coordenadora do Idec, tais
como a criação de instituições, associações e secretarias que dão o aparato
necessário ao consumidor - tanto no entendimento de seus direitos quanto de
reclamações. É o caso do trabalho realizado pelo Procon, de sites da iniciativa
privada e mesmo pela plataforma do governo consumidor.gov.br, criado em 2014.
Para se ter uma ideia da adesão, foi divulgado que o site recebeu mais de 420
reclamações por dia – 17 queixas a cada hora, em média.
Agências reguladoras
ainda "fecham os olhos"
Apesar da luta de mais de duas décadas pelos direitos do
consumidor brasileiro, ainda há muito a ser alcançado. Diariamente são
realizadas milhares de reclamações dos consumidores por todo o País,
especialmente quando se trata de empresas de telecomunicação, as mais
reclamadas segundo o Proteste. E isso acontece mesmo com o Regulamento Geral de
Direitos do Consumidor de Serviços de Telecomunicações (RGC).
REUTERS/Eduardo Munoz
Diariamente são realizadas milhares de reclamações dos
consumidores por todo o País
Apesar de existir a lei, que teoricamente não exigiria
regulamentações específicas, muitas vezes é preciso a aplicação dessa manobra –
e mesmo assim, como vemos no caso do RGC ou da Lei do SAC (Serviço de
Atendimento ao Consumidor), as regras continuam a ser descumpridas. Por isso, o
consumidor brasileiro ainda enfrenta desrespeitos na hora da compra
relacionados a produtos pagos e não entregues, a cobrança indevida em contas de
água e luz, a dificuldades em ligações via smartphone e ao uso da banda larga.
Também há abusos em direitos essenciais, como aqueles feitos
por companhias de saneamento básico que cobram taxas de esgoto a consumidores
que, na verdade, não têm acesso a isso. Portanto, para Elini, a implementação
do código de defesa em espaços públicos e privados é urgente, especialmente em
agências reguladoras como Anac, Anatel, Aneel e o próprio Banco Central – que,
de acordo com a especialista, ainda “fecham os olhos a esses direitos”.
“Empresas grandes ou agências reguladoras têm uma equipe
jurídica, pessoas bem preparadas para estabelecer e fazer cumprir regras
internas. É impossível dizer que são inocentes, que não sabem os direitos
estabelecidos no CDC, mas muitas vezes os descumprem. É necessário não só o
conhecimento, mas o cumprimento da Lei”, pontua.
O cuidado para que não haja regressão dos direitos também
foi citado pela especialista. Um dos exemplos é a discussão atual sobre a
presença do símbolo “T” em alimentos transgênicos, direito à informação do
consumidor já conquistado anteriormente, mas que vem sido contestado pela
Indústria Alimentícia.
Outro movimento essencial para ser refletido neste dia 15 de
março é o papel que os consumidores têm na luta pelos direitos e na pressão
pela garantia do cumprimento dos mesmos nas relações comerciais. A tecnologia
pode ser uma grande aliada, na opinião da especialista.
“Acho que hoje temos de considerar que o consumidor
brasileiro começou a cobrar mais, de maneira positiva, ou seja, a entender mais
o direito que ele tem, além dos deveres, entender a relação para se relacionar
com o fornecedor de uma forma melhor. Acho que se associar, buscar os direitos
coletivos, usar canais de reclamação e a própria imprensa pode ser um meio para
trazer ainda mais melhorias”, finaliza Elini.
Dia Mundial do Consumidor
O Dia Mundial do Consumidor é comemorado anualmente em
15 de março.
A dada foi criada
para proteger e lembrar sempre dos direitos do consumidor, não apenas entre as
pessoas que consomem, mas que também as empresas e lojas lembrem do compromisso
em respeitar todas as leis que protegem os seus consumidores.
Como consumidor se
considera todo aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou
transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por
empresas ou pessoas que exerçam com caráter profissional uma atividade
econômica que vise a obtenção de benefícios.
Origem do Dia
Mundial do Consumidor
O Dia
Mundial dos Direitos do Consumidor foi instituído pela primeira vez no
ano de 1962, pelo presidente dos Estados Unidos John Kennedy, como uma forma de
dar proteção aos interesses dos consumidores americanos.
O presidente
norte-americano ofereceu quatro direitos fundamentais aos consumidores:
1 - Direito à
segurança
2 - Direito à
informação
3 - Direito à
escolha
4 - Direito à ser
ouvido
Depois de 23 anos
da ação de Kennedy, em 1985, a Assembleia Geral das Nações Unidas (ONU) adotou
o dia 15 de março como o Dia Mundial do Consumidor, tendo como base as
Diretrizes das Nações Unidas, dando legitimidade e reconhecimento internacional
para a data criada por Kennedy.
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